terça-feira, 14 de março de 2023

How to be a man in a World women are not welcome

This past week - women’s week - I’ve seen an overwhelming amount of truths regarding gender biases. Truths that go beyond research and statistics. I’ve felt and lived through them. The week was empowered by me taking a course on public speaking which addressed the issue of accent bias. And to finalize, on Saturday night I went to see a play which was a mind blowing show of performance, addressing the female existential issues of the XIX century, slapping on our faces they have not changed all that much. 
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It was a depressing week, to say the least. One cannot save oneself from the unconscious bias of others. 
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And then today, I remembered this story… So simple and trivial that it made me smile. 
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Once upon the past ten years, I pick up the phone. This gentleman - who I had already met in person - wants to talk to my boss by all means immediately. I am aware of the subject and he knows it. I politely say we can book a time for them to talk still that afternoon. He insists to be passed through immediately. I repeat that we can book a time for that same afternoon. He hangs up on my face without saying goodbye or thank you. Immediately he sends a line to my boss that goes more or less like this:
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Dear Mr. M,
I couldn’t pass through your secretary. Would you please call me back to talk about XYZ. 
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My boss forwards the message to me, ccing the gentleman and adding the line: “Marina, pls book a time”.
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So simple. So trivial. So effortless. And powerful.
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Marina Casadei
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"Reality... Accept it, or live in denial".
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quinta-feira, 4 de junho de 2020

O Palco

Eu sigo pensando em algo que dizer... Mas o que dizer diante de tantos números catastróficos, oriundos de uma sociedade doente?

Se tirarmos uma foto da sociedade a cada 500 anos no passado, veremos que houve evolução. Sim. Mas diante de tamanha revolução tecnológica nos últimos 100 anos, esperávamos também uma revolução cultural.

Ainda estamos discutindo RACISMO. Sim, porque falha-se em aceitar que isso existe e é estrutural na melhor das hipóteses. Na pior, se revela em forma de assassinato.

Ainda estamos discutindo MACHISMO. Falha-se em aceitar que está perpetuado no íntimo de cada homem e mulher, declarado em cada risada de uma piada infeliz que denigre a imagem feminina e passa despercebida, até culminar com estupro sem culpados e feminicídio.

Ainda estamos discutindo HOMOFOBIA, simplesmente porque há um grande grupo de pessoas que se incomoda com a felicidade alheia. E eventualmente, esse incômodo vira ódio e culmina na morte de um gay a cada 19h, só no Brasil.

Ainda estamos discutindo o dever do estado sobre as CLASSES MENOS PRIVILEGIADAS. Não porque a escalada da classe média seja menos digna ou fácil. Não é. Mas tal classe batalha para chegar em algum lugar, enquanto a outra batalha para não sair do lugar. Sem batalha, o destino implacável é a fome.

E ainda nem começamos a discutir a falta de respeito e de responsabilidade sob crianças e adolescentes, que seguem desgovernados por famílias disfuncionais e um estado que não acolhe, e que dentro de sua vulnerabilidade não conseguem formar grupos para gritar por si mesmo. Tal privilégio é reservado aos adultos.

E se abrirmos a porta, ainda tem tantos outros grupos para serem incluídos aqui. Menores, ou ainda mais vulneráveis.

De quantas mortes estamos falando, afinal? Ou de vidas arrasadas?

A negação de alguns é fruto do horror de abrir os olhos. Mas de tantos outros, é pura ruindade, pois são os vetores do problema. Não existe oprimido sem opressor. Existe quem pode escolher entre fazer o bem ou o mal. E existe quem só pode escolher entre sofrer calado ou aos gritos.

Respeito quem adota o silêncio como aliado. Eu também o faço por vezes. Apenas tenhamos ciência de que enquanto o silêncio não agride, ele é palco.

E os atores, estão todos lá. E sempre estarão. Ódio, egoísmo, poder e vulnerabilidade. Todos juntos e grande elenco.

Esse show precisa acabar. Sem palco não tem show.

Marina Casadei

domingo, 24 de abril de 2016

A arte de promover o conformismo

Recentemente, curti uma publicação no Facebook que falava sobre os livros de George Orwell e Adous Huxley, 1984 e Admirável Mundo Novo, respectivamente.
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Estes livros afetaram meu senso de observação do mundo e, principalmente, meu gosto pela leitura, porque depois deles, ficou difícil apreciar outras obras de ficção. Eu era uma pessoa inconformada mesmo antes dos livros, mas estas obras me ajudaram a construir com maior clareza aquilo que já enxergava de maneira subconsciente.
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Sobre o 1984, ele traz dois conceitos principais: o primeiro é o culto ao ódio. O fato de que o governo estimula o ódio entre as pessoas para que um fiscalize o outro. Pais, filhos, maridos, esposas, se veem como inimigos uns dos outros e fazem denúncias se percebem algo estranho. O segundo é a manipulação da imprensa. Na história, o personagem principal trabalha justamente no órgão do governo que faz a alteração dos jornais do passado. Ou seja, o governo manipula os registros do passado da maneira como bem entende e, por vezes, lança em um dia a notícia inversa ao que divulgou no dia anterior. As pessoas estão tão habituadas ao fato de que tudo muda o tempo todo e acreditam que tudo o que o governo diz é verdade absoluta e incontestável, que elas NÃO PERCEBEM as mudanças, por mais repentinas que elas sejam.
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Sobre o Admirável Mundo Novo, a obra apresenta um mundo onde todos são felizes fazendo exatamente o que fazem, desde o faxineiro até os cientistas, pois foram doutrinados para aquilo desde o nascimento. O novo mundo também induz ao sexo indiscriminado e uso de entorpecentes, pois são maneiras eficazes de manter a mente humana distante de rebeldias e questionamentos em geral. A instituição familiar deixa de existir. Qualquer laço afetivo com um amigo um pouco mais íntimo é mal visto. Impera a futilidade das relações. E, por fim e no ponto que eu queria chegar, há um estímulo muito grande à prática de esportes que gerem consumo. Todos os jogos precisam de alguma maneira gerar consumo; precisam fazer uso de algum equipamento ou acessório que se perca durante o jogo, obrigando as pessoas a estarem sempre comprando. Esportes que façam uso de material duradouro ou ainda, que não precise de acessório algum (roupas especiais, rede, raquete, etc.) são extintos.
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A esta altura do campeonato, mentes inconformadas já compreenderam a mensagem que eu quero expressar. Para aqueles que ainda estão em dúvida, peço que sigam lendo o artigo.
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Quero deixar claro que não estou aqui para puxar nada para lado nenhum. Quero simplesmente chamar a atenção para fatos presentes que ninguém percebe.
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No mês de novembro de 2014, lembro de ver uma reportagem na rede globo falando da operação Lava Jato, na qual o digníssimo Willian Bonner citava o nome de uma lista de políticos envolvidos no escândalo e, toda vez que ele citava o nome de um político do PT, ele fazia questão de dizer “Fulano do PT” e quando ele citava o nome de um político de outro partido, ele simplesmente falava o nome, sem citar o partido. Embora eu não tenha visto nenhum tipo de repercussão nem mesmo nas redes sociais, eu acho que houve algum processo a esse respeito, pois nunca mais aconteceu algo do tipo. Eu lembro ainda que foi a rede globo que expôs em rede nacional aquele gráfico ridículo com o mapa do Brasil salientando os estados onde o PT venceu e onde o PSDB venceu a última eleição, ignorando o fato de que nosso voto é por cidadão e não por estado –  eu lembro que no instante em que vi aquilo a revolta me corroeu por dentro. Depois percebi nas redes sociais que eu não senti isso sozinha, pois as críticas foram muitas, inclusive provando a quem soubesse matemática que, em números, o PT recebeu mais votos na região sudeste do que em qualquer outra. Lembro ainda que desde essa época já se falava de impeachment e lembro ainda que a Dilma deu uma entrevista ao Willian Bonner, na qual ele chegou ao extremo de se exaltar com ela (Bonner, vc é tão bom ator quanto jornalista – já pensou em trabalhar em alguma novela?) alegando que ela não havia respondido uma pergunta. No instante em que ele falou isso, a presidente disse claramente “a primeira coisa que eu te respondi foi a sua pergunta, e a resposta foi ‘não, a situação da saúde pública não é satisfatória’ ”. O mais engraçado foi o efeito que isso teve na sociedade: em todos os lugares, na academia, no trabalho, na rua, eu via as pessoas comentarem, mesmo a título de piada, que a Dilma não respondeu as perguntas do Bonner. Meu Deus... Olha o 1984 acontecendo bem no meu nariz! Minha gente, eu NÃO estou dizendo que as respostas da Dilma foram satisfatórias ou que apoio o governo dela, ou que acho que é golpe! Mas a Dilma respondeu as perguntas do Bonner SIM. É uma questão de semântica, de compreensão da língua portuguesa. Ela respondeu! É claro que toda resposta vinha emendada de uma propaganda de seu próprio governo, COMO TODO POLÍTICO FAZ, mas há uma divisão entre a resposta das perguntas e a propaganda. Se não acredita, faça um exercício sincero: procure a entrevista no youtube, transcreva pergunta e resposta (eu não vou fazer isso para você) e peça que outra pessoa leia. Não conte a pessoa do que se trata, omita o nome dos atores dessa entrevista e peça uma opinião neutra. É só um desafio, não para provar que o lado vermelhinho está certo, mas para provar a rede globo faz o que bem entende com a cabeça das pessoas e ninguém percebe.
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Agora deixando a política de lado, pois a essa altura certamente tem gente querendo me pendurar no tronco e me açoitar em praça pública (é isso que tenho ouvido colegas dizerem que deveria acontecer com quem tem opinião favorável ao governo... E embora eu esteja declarando não escolher um lado, assim me rotulam de qualquer forma), eu gostaria de chamar a atenção para uma série de coisas que têm acontecido na sociedade e que temos uma posição absurdamente passiva diante delas – apesar de agora o “gigante ter acordado”.
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O primeiro é o desleixo na nossa classe médica. Na atual conjuntura, eu teria muito mais vergonha de ter essa profissão do que orgulho. Hoje, você luta para encontrar um médico na faixa etária dos 50, pois você ainda pode confiar nessa turma. Não porque eles têm experiência, mas porque vêm de uma época onde essa profissão era honrada. Hoje, é uma profissão vendida a campanhas baratas (ou caras…) de laboratórios farmacêuticos. Hoje, você chega no PS com uma infecção de garganta, secreção amarela e até febre e o médico tem a cara de pau de falar na sua cara que isso não quer dizer que você precisa de antibiótico. Ele te receita um corticoide, que te acomete a uma série de efeitos colaterais graves. Ainda que você diga que não pode tomar corticoide, que tem problemas no aparelho digestivo, ele insiste. Quando o médico receita o antibiótico, após no mínimo a sua segunda visita ao PS (é o protocolo, não importa o seu estado, eles só irão te receitar o antibiótico na segunda visita), ele não receita a boa e velha amoxilina, que custa algo próximo aos sessenta reais. Ele receita um antibiótico caríssimo, que custa na casa dos cento e oitenta reais porque sabe que você vai acabar comprando. Eu nunca entendi porque os médicos precisam saber nossa profissão, mas quer saber, assumo o compromisso público com meu leitor de me declarar auxiliar de limpeza quando for ao PS da próxima vez... Vamos ver se consigo uma medicação mais em conta. É frequente os médicos receitarem medicamentos novos, que a gente chega ao ponto de ter dificuldade para encontrar, quando na verdade tem uma série de medicamentos maduros e mais baratos que fariam o mesmo efeito. Claro... O medicamento novo traz uma série de benefícios ao médico, ao laboratório e ao paciente... Ops, o paciente que se exploda! O paciente é usado como cobaia sem autorização – no mínimo, para ser uma prática honesta, o médico deveria nos dar a opção de usar um medicamento maduro ou outro novo que promete algum benefício maior. A opção deveria ser do paciente. O corpo é do paciente. Isso que médicos têm feito é abuso de poder intelectual, por serem detentores do conhecimento, é abuso de poder legal porque hoje não podemos comprar nossa própria amoxilina (interesse de quem?) e é cruel. A história que vivi no PS e que retratei aqui de maneira indireta é real e não foi minha única experiência do tipo – tenho histórico de problemas com médicos desde pelo menos meus dez anos. E conheço muita gente com reclamações semelhantes ou ainda indignadas com a falta de competência.
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Alguma semelhança com o que fazem no Admirável Mundo Novo com os esportes? Vou construir a semelhança: os médicos, hospitais, laboratórios, têm intenção de nos manter doentes para gerarmos o máximo de lucro a eles, ou ainda, de nos gerarem mais doenças, receitando corticoide para infecções, por exemplo, nos obrigando a tomar antibióticos ainda mais fortes a partir da segunda consulta e acrescentando ao nosso coquetel outras medicações para o aparelho digestivo, para tratar o mal que o corticoide faz. E antes que me acusem de qualquer outra coisa, não é teoria da conspiração. Está acontecendo bem no nosso nariz e ninguém enxerga, como no 1984, onde nutriam o ódio entre as pessoas sem ninguém perceber e alteravam os jornais do passado.
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Falemos agora do adorável trânsito da cidade de São Paulo.
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Eu não estou vendo nenhum tipo de melhoria nas nossas avenidas, ou ponto de ônibus ou melhorias em geral ao transporte coletivo apesar da arrecadação absurda com a tolerância zero da aplicação de multas. Eu moro em uma quadra repleta de prédios e os prédios por aqui são populares, então têm apenas uma vaga. Muita gente hoje tem dois carros porque precisam ter – e não porque estejam jogando dinheiro fora. E por aqui, as ruas ficam repletas de carros estacionados. Havia uma época em que parávamos em cima da calçada para facilitar a passagem dos carros pela rua, porque não passam pedestres por aqui, já que as ruas não têm absolutamente nenhum comércio, a entrada das casas e prédios são voltadas a rua principal e as ruas são sem saída. E, então, a CET passou a ser frequentadora da região para multar os veículos em cima da calçada ou que param na contra mão, ainda que isso não prejudique nenhum pedestre. Quando a CET vem, eles vêm por volta das 06h10 da manhã, com a maldade de pegar o pessoal antes de todo mundo sair para trabalhar. O que eu acho mais irônico nisso tudo é que eu nunca cruzei com uma ronda policial na região. Eu saio de casa muito cedo, com as ruas desertas, com o pavor de ser violentada no terreno baldio que tem no fundo das tais ruas sem saída, onde não tem nenhum comércio, residência, portaria de prédio, ninguém a quem eu possa pedir socorro. Eu nunca cruzei com uma ronda policial que possa me proporcionar algum tipo de segurança, mas já cruzei diversas vezes com a CET, multando os veículos que não prejudicam ninguém.
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Os dois relatos que coloquei aqui já me estimulam ódio o bastante para querer sumir desse país, mas eu ainda tenho mais.
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Casamento gay não é algo passível de opinião. Precisa ser aprovado, doa a quem doer. Quando eu era criança, na minha ingenuidade, eu já pensava sobre casamento em grupo, ou entre amigos do mesmo sexo, não pelo sexo carnal presente numa relação de casal, mas pela legalidade que esse contrato representa. Divisão de bens, direitos para acompanhar a outros países, compromisso de cuidados, de suporte, de doação de um para outro. Por que eu tenho que ser legalmente ligada somente a minha família biológica e um eventual marido? Eu não posso registrar legalmente a família que construí com meus amigos? Não faz sentido.
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Descriminalização do aborto. Os motivos são tão óbvios que chega a ser redundância elencar. Mas vamos lá: hoje falamos em descriminalização, em vez de liberação, porque todo mundo sabe que acontece, independente de lei. Todo mundo já sabe que é uma questão social, visto que a classe A faz aborto legalizado nos EUA, a classe B faz aborto clandestino com um médico formado e a classe C e inferior faz do jeito que for. Com um açougueiro, com drogas ilícitas, dilacerando seus úteros com químicas, mas fazem. Aqueles que não fazem mas queriam muito ter feito, certamente farão dessa criança uma escrava de sua própria rejeição. Até o Dr. Drauzio Varella, que é talvez a única figura que eu ainda respeite na rede globo, é a favor. Descriminalizar o aborto não significa obrigar alguém a fazer. Simplesmente dá a pessoa liberdade de escolher. Optar por um aborto não é uma escolha que mulher nenhuma faz com prazer. É uma escolha difícil, que traumatiza pelo resto da vida e dói, dói na alma – então não condene essa mulher. E se a questão é divina, religiosa, então sejamos coerentes: vamos impor a religião desse país que se diz livre e moderno, mas tem cérebro de amendoim.
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Eu ainda poderia falar sobre outras ideias subversivas que tenho, tais como a flexibilização das leis trabalhistas (e aí, sou petista ou coxinha agora), estudante de escola pública pagar meia na universidade particular, leis penais mais severas sim, polícia intelectualmente mais preparada (o curso deveria ser universitário e o PM deveria ter título de doutor, assim como os médicos, embora estes não façam jus), aula de cidadania, consciência coletiva, bom senso, amor ao próximo, durante a escolaridade regular. 
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Para cada um destes itens eu poderia escrever um artigo inteiro. Mas vou ficando por aqui, nutrindo a infeliz esperança de que um dia o gigante realmente acorde.
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Marina Casadei

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Eu não sou virtual

Para quem disse que imitava a sociedade para pertencer a ela, acho que estou longe de qualquer chance de sucesso.
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Meus sentimentos são complexos, repletos de laços com passado, presente e expectativas de futuro. Sentimentos envolvem terceiros de maneira direta, por isso não podem ser resumidos numa única frase, explícita, escrita, de maneira indireta.
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Se curtidas são sinônimos de afeto, se compartilhamentos são sinônimos de apoio, se comentários são sinônimos de parceria, então não sou sua amiga.
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Se selfies são provas de felicidade ou beleza, então não sou feliz, tão pouco bela, e nem quero ser. Se check in significa estar presente, devo estar ausente de aqui. Se convites são eventos numa agenda virtual que depende do meu ato de logar, então não sou bem vinda.
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Se número de contatos significa o quanto estou disposta a me doar, sinto muito. Não lembro o nome de todos e não tenho tempo para o pequeno círculo do qual nunca me esqueço (infelizmente).
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Eu não nasci virtual. Nasci de uma conexão física, sou composta de carbono e habitada por espírito.
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Posso encerrar todos os meus acessos e continuar existindo. Ninguém vai saber. Posso deixar de existir e minha vida virtual permanecer intacta. E muitos nunca saberão. E se um dia alguém hackear minhas senhas, nem de longe terá roubado minha alma.
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Aprecio a tecnologia que facilita a vida e aproxima as pessoas e lamento com pesar aqueles que confundem facilidade com futilidade e aplicativos com o benefício de estar distante.
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As coisas não são o que são, mas sim, o significado que nós damos a elas. E há quem prefira a suavidade da tela ao desconforto da vida.
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Meu legado não é virtual e minha passagem não é por fios de fibra óptica.
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Meu perfil, meu mundo virtual e minhas notícias são só a parte exterior, pública e simplificada do meu ser. Renego essa vida, porque não estou disposta a abrir mão do mundo que construí fora. Ou seria o contrário?
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Não faço parte do novo mundo.
Não nasci virtual.
Me nego a ser virtual.
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Sou pedaço de partícula humana dispersa no Universo cujo todo está fora do meu alcance conhecer.
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Nasci. Sou real. E faço questão de saber existir.
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Marina Casadei
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sábado, 31 de outubro de 2015

Será que chegamos ao princípio do fim da cultura machista?

Apesar da tragédia que todos os relatos do #primeiroassedio trazem, fico satisfeita de ver que finalmente este tema ganhou alguma atenção em nosso país. É interessante saber que bons rapazes estão lendo os relatos e perguntando às suas namoradas e esposas, atônitos: “isso é verdade? Essas coisas acontecem?”. Isso porque o tema é tratado de maneira tão velada, ou de maneira tão comum, que a sociedade (especialmente a masculina) não tem dimensão do tamanho do problema.

Seguindo a proposta do #primeiroassedio, registrarei aqui minha experiência pessoal. Não dá para falar só do primeiro assédio, ou do pior assédio, porque a lista é grande e a sociedade precisa saber. 

1) Com 8 anos de idade, um coleguinha da mesma idade simplesmente resolveu passar a mão na bunda de todas as meninas da sala. Inclusive na minha. Eu bati nele, então me senti vingada. Hoje, com 30 anos, me pergunto quem foi o adulto pervertido que ensinou o garoto a fazer isso, pois ele não inventou isso sozinho com aquela pouca idade. 

2) Com 12 anos de idade, comecei a sofrer da clássica humilhação de ser “gritada” de gostosa (em alto e bom tom para todo mundo ouvir) e ser medida dos pés a cabeça por homens de todas as idades (dos 12 aos 70 anos). E, com isso, vieram mãos indesejadas por todas as partes do meu corpo, puxões de cabelo e tentativas de me beijar a força. Certa vez, em um barzinho, um rapaz enorme tentou me agarrar. Eu tentei empurrar, mas como não estava conseguindo me livrar dele, comecei a gritar e me joguei no chão. Ele me largou e me xingou de nomes horríveis. Ao me levantar, notei um segurança guarda-roupa ali, parado, à paisana. Na verdade, ele esteve lá o tempo todo e não fez nada. 

(abrindo um parênteses nessa história de fiu-fiu e chamar de gostosa, isso é tão humilhante, tão repugnante, a minha raiva disso é tão grande, que cada vez que acontece, minha vontade é ter uma arma na mão e dar um tiro na boca do cara. Pior que a maioria dos caras fazem isso a título de piada... Eles riem enquanto nós nos sentimos violadas. Cara, a próxima vez que você mexer com uma mulher a distância, imagina um p# bem grande entrando no seu traseiro... Mas imagina mesmo, veja a cena, pois é esse nível de asco que aquela mulher está sentindo) 

3) Aos 18 anos, sofri minha primeira e única “encoxada” no transporte público. Eu estava no ônibus e uma senhora (com “a” – não é erro de digitação) encostou atrás de mim de um jeito que me senti mal. Estava muito cheio, então achei que o problema era eu. Fui um pouco mais para o lado direito, e ela veio também. Fui mais. Ela veio. Fui mais ainda. E ela veio, se esfregando. Fui para todo o meu lado esquerdo e fiquei longe dela. Aos poucos, ela veio. Até que a velha enfiou sua mão no meio das minhas pernas. Tirei a mão dela e ela fez de novo. Logo um rapaz se levantou e eu sentei… Foi como me livrei dela. Me senti a pessoa mais tonta do mundo. Fiquei com raiva de mim e decidi que isso nunca mais aconteceria. De fato, não aconteceu… Inclusive, certa vez chutei um homem no metrô ao vê-lo encoxar outra moça. Mais engraçado é um monte de gente em volta, se fazendo de morta. 

4) Entre 18 e 19 anos de idade eu trabalhei no comércio, cada ano em uma loja. Na primeira, eu trabalhava com um cidadão escroto chamado Fábio, na faixa de uns 45 anos de idade. Ele tinha uma enteada de 17 anos... Falava que ela era gordinha e que não tinha o meu “corpinho”. Sempre que a dona da loja não estava (e ela saía bastante), ele começava a contar suas histórias sexuais. Quem ele comeu ou deixou de comer na adolescência. Era o tempo todo. Sem falar que ele usava o banheiro de porta aberta, escancarada. Eu não gostava daquilo, mas só me dei conta do nível do problema quando um amigo do cursinho pré-vestibular me alertou. A partir disso, quando dava 18h00, eu saía desesperada correndo, com medo que ele fechasse a porta da loja comigo dentro. Aos 19 anos, fui trabalhar em outra loja e nesta um sujeito, escroto também, na faixa dos 60, chamado Luiz, passou a mão em mim duas vezes. A primeira eu fiquei na clássica dúvida “será que foi impressão?”. A segunda foi no meu aniversário: veio me dar um abraço de parabéns e meteu a mão nos meus seios. Comecei a chorar compulsivamente, me escondi. Depois desci, ainda chorando, falei para ele, na frente de todos mesmo, que sabia o que ele tinha feito e para nunca mais chegar perto de mim. Em seguida, subi na sala do dono da loja para reportar a situação e a resposta dele foi “ah... mas ele é um coitado neh. Eu tenho pena dele”. Pior que esse dono de loja tinha três filhas mulheres – ele não pensou que podia ser com elas? Por alguma razão, passei a odiar aniversários. 11 anos depois, quando alguém vem me abraçar no meu aniversário, eu recuo e as pessoas percebem. É involuntário. 

5) Ainda aos 19 anos de idade, no outro cursinho pré-vestibular, eu costumava dormir muito nas aulas, pois acordava 05h30 e chegava em casa meia-noite... Eu capotava na aula; não conseguia controlar o sono. Se aproveitando desse fato, tinha um colega que costumava me alisar enquanto eu dormia. Era nojento. Combinei com uma amiga para ela não deixar mais ele sentar do meu lado e ela passou a me dar cobertura. Hoje me arrependo de não ter quebrado a cara dele. 

Já fui seguida na rua por um homem que devia estar muito mal intencionado. Já sofri assedio em empresa, praticado por chefe e por chefe de chefe. Já fui humilhada através da internet, porque pegaram fotos minhas e fizeram parecer outra coisa. Desejei, inúmeras vezes na minha vida, não ser mulher. 


Além da violência sexual, do assédio sexual e da violência verbal, as mulheres são vítimas de um outro mal, silencioso, e que está tão enraizado em nossa sociedade que a maioria sequer percebe: o machismo. Machismo este que habita inclusive muitas mulheres e que faz com que assuntos tão graves e tão presentes em nossa rotina sejam tratados com desdém, como algo comum e sem importância. 

Nós ainda somos consideradas culpadas pela maior parte daquilo que somos vítimas. Ou porque saímos, ou porque vestimos, ou porque bebemos, ou porque nascemos. 

Marina Casadei
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terça-feira, 2 de junho de 2015

Honra à Constituição Brasileira

Não é meu perfil publicar esse tipo de texto, que tanto me expõe. Mas de alguma maneira que não sei explicar me sinto impulsionada a fazê-lo... Isso porque já passaram 60 dias desde que o escrevi. É como se fosse um dever meu com a sociedade - ou pelo menos, com parte dela.

No dia 31-março, por volta das 07h30 da manhã, ouvi a seguinte frase de uma jornalista da rádio Jovem Pam:

“Segundo a constituição, todos são iguais perante a lei. Oras, se eu sou igual ao meu vizinho, porque ele tem direito a cota e eu não”.

Acho que não preciso dar mais detalhes sobre qual era o tema abordado pelo programa.

A discussão em questão me levou de volta aos meus dezoito anos, pois foi nessa época que os projetos de cota começaram. E nessa viagem de volta ao passado, apliquei o ilustre raciocínio da tal jornalista ao contexto da minha vida naquela época:

“Oras, se todos somos iguais perante a lei, porque meu vizinho faz Direito na PUC, enquanto eu passo fome?”

“Oras, se todos somos iguais perante a lei, porque eu, que sempre fui uma aluna aplicada, não tenho a menor chance de estudar Medicina, tenho que trabalhar para pagar o cursinho e, provavelmente, nem com 3 anos de cursinho recuperaria tudo o que não aprendi na escola?”

“Oras, se todos somos iguais perante a lei, porque tantos jovens só começam a trabalhar nos seus últimos anos de faculdade, enquanto eu, com 18 anos e cheia de vontade de ser alguém na vida, tenho que trabalhar de segunda a sábado, do outro lado da cidade e ainda aguentar velhos torpes, entre os quais médicos e advogados que alguém deve acreditar que sejam de respeito, me despindo com os olhos, como se eu fosse uma cadela?”

Eu trabalhei por um ano no comércio, em um bairro nobre da cidade de São Paulo. Vivi diversos constrangimentos por clientes me cantarem ou me olharam de certa maneira que jovem nenhuma quer ser olhada. Sofri diversos tipos de humilhação ocasionadas pelo público alvo medíocre que não convém comentar.

Naquela época, eu fiz uma dura escolha na vida: deixei de comer para estudar. Eu almoçava marmita na loja por volta das 13h00 e a noite ia para o cursinho, sem comer nada. Meu salário só dava para pagar o cursinho, a condução para ir ao cursinho e 22 cafés puros, de coador. Na primeira quinzena do mês, eu ainda conseguia comprar um pacote de bolachas Adria e fazia ele durar a semana inteira. Na segunda quinzena do mês, eram só os 50ml de café puro mesmo.

Quando chegou o mês de julho, eu não aguentava mais aquela rotina. E o maior problema não era a fome - já tinha me acostumado. O problema era o inverno. Eu passava frio o dia inteiro na loja, passava frio no cursinho ao ponto de não conseguir prestar atenção na aula e ainda tinha que tolerar gente com aqueles casacos de neve (que acho que os vestiam somente para ter onde exibi-los) dizendo que a sala estava abafada, para esfriar mais o ar. Eu não tinha roupa adequada. Me dirigi ao coordenador para verificar se frente a minha situação seria possível algum desconto na parcela – quem sabe assim eu seria capaz de comprar um casaco. Ele me tratou com desprezo, como sendo a coisa mais comum do mundo um aluno ir pedir desconto, sequer se deu ao trabalho de ouvir a minha história e disse que só o que podia fazer era re-parcelar o curso (as parcelas que iriam até janeiro, seriam redistribuídas até fevereiro).

Saí do cursinho. Poucas vezes na minha vida eu chorei como chorei naquela ocasião.

Eu me pergunto: será que a tal jornalista da Jovem Pam, com seu raciocínio altamente lógico, viveu algo parecido com o que eu vivi?

Eu nunca fui beneficiada por nenhum sistema de cota, nem mesmo pela isenção da FUVEST. Eu não sou a favor de cotas em universidade para negros, porque penso que os negros que fariam uso dela seriam justamente aqueles que, através das gerações, já superaram seu histórico escravo e hoje ocupam um lugar na classe média ou superior.


Mas sou sim a favor de cotas para negros em mestrados e doutorados. Não podemos negar o racismo ainda presente na sociedade e uma vez que um doutor pode escolher quais trabalhos quer orientar, uma medida se faz necessária.

Sou a favor de cotas em universidades públicas para estudantes de escola pública. Penso ainda que estudantes oriundos de escola pública, necessariamente, deveriam pagar metade da mensalidade em uma universidade particular. Isso não é “dar o peixe”, como alguns gostam de dizer. Isso é dar oportunidade para que uma pessoa que quer, aprenda a pescar.

Dessa forma, então, nossa constituição seria honrada. Poderíamos dizer que somos iguais perante a lei e que, quando não temos igualdade de oportunidades, a lei nos garante esse direito. E não o contrário.


Marina Casadei
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